[26.dezembro.2008]

life is not what it's supposed to be. it's what it is. the way you cope with it is what makes the difference.

virginia satir

do que a vida é ao que queríamos que fosse vai uma distância enorme. tão grande que muitos homens caem nesse vazio e nunca se tornam a encontrar. cada vez mais sinto o quanto estas expectativas, o lidar com a vida em função do que queríamos que ela fosse, nos impede de apreciar o que vida tem para nos dar.
arrisco-me a dizer que a maioria das pessoas se rege por esta máxima. apreciar o que a vida nos dá em comparação com o que queríamos que fosse é algo que parece bastante enraizado em nós mas desconheço o porquê. passamos o tempo a exigir da vida o impossível. quero ser mais bonito, mais inteligente. quero que aquela pessoa goste de mim. que todos os problemas se vão embora. como se a vida e o que nela sentimos não fosse natural. como se fosse algo estranho à nossa condição humana. negamos no fundo aquilo que somos e insistimos em viver um eu não real.
mas depois a realidade chama. nasce a frustração. porque é que tudo não pode ser mais fácil pensamos. talvez devêssemos fazer a pergunta de outra forma: porque é que não aceitamos que a vida é difícil?
como podes ser feliz se achas sempre pouco o que a vida te dá?

[26.dezembro.2008]

não há para onde fugir.
os grandes caralhos andam aí.
irão foder o que lhes vier à frente.
ponham-se a pau.

democracia de harold pinter


[26.dezembro.2008]

um homem desconhecido escreveu-me uma carta. o homem desconhecido não me falava da europa, nem de moisés, nem dos grandes ou pequenos profetas, nem do imperador da rússia, nem do seu temível antecessor, o czar ivan, o terrível. não falava do presidente da câmara, nem do vizinho sapateiro, nem da cidade próxima, nem das cidades longínquas; e também a floresta, com as suas muitas corças, onde me perco todas as manhãs, não é mencionada na carta. também não me diz nada sobre a sua mãezinha ou sobre as irmãs que certamente se casaram há muito. talvez a sua mãezinha também tenha morrido, senão como seria possível não encontrar qualquer referência a ela numa carta de duas folhas! mostra ter uma confiança muito, muito maior em mim; trata-me como um irmão, fala-me da sua miséria.

rainer maria rilke em histórias do bom deus

este livro toca-me muito para além do explicável. toca-me naquilo que é apenas meu. e será que as idiossincrasias valem a pena serem explicadas? uso-o como tributo. a um dos poucos que escreveu para além da miséria que via no seu umbigo: harold pinter.

[15.dezembro.2008]

so wake up run your lips across your fingers till you find
some scent of yourself that you can hold up high
to remind yourself that you didn't die
on a day that was so crappy whole and happy you're alive

you're in the bathroom carving holiday designs into yourself
hoping no one will find you but they found you
and they took you
and you somehow survived

so wake up and if the holidays don't hollow out your eyes
then press yourself against whatever
you find to be beautiful and trembling with life
because i'm so happy you didn't die

para a a.

(neutral milk hotel)

[13.dezembro.2008]

não é só o avanço tecnológico que marcou o início deste milénio. as relações afectivas também estão passando por profundas transformações e revolucionando o conceito de amor.
o que se busca hoje é uma relação compatível com os tempos modernos, na qual exista, individualidade, respeito, alegria e prazer de estar de estar junto, e não mais uma relação de dependência em que um responsabiliza o outro pelo seu bem-estar.
a ideia de uma pessoa ser o remédio para a nossa felicidade, que nasceu com o romantismo, está fadada a desaparecer neste inicio de século.
o amor romântico parte de uma premissa que somos uma fracção e precisamos encontrar nossa outra metade para nos sentirmos completos.
muitas vezes ocorre até um processo de despersonalização que, historicamente, tem atingido mais a mulher. ela abandona suas características para se amalgamar ao projecto masculino.
a teoria da ligação entre opostos também vem dessa raiz: o outro tem de saber fazer o que eu não sei. se sou manso o outro deve ser agressivo e assim por diante. uma ideia prática de sobrevivência e pouco romântica, por sinal.
a palavra de ordem deste século é parceria. estamos trocando amor de necessidade por amor de desejo. eu gosto e desejo a companhia, mas não preciso, o que é muito diferente.
com o avanço tecnológico, que exige mais tempo individual, as pessoas estão perdendo o pavor de ficar sozinhas, e aprendendo a conviver melhor consigo mesmas. elas estão começando a perceber que se sentem fracção, mas são inteiras. o outro, com o qual se estabelece um elo, também se sente uma fracção. não é príncipe ou salvador de coisa nenhuma. é apenas um companheiro de viagem.
o homem é um animal que vai mudando o mundo e depois tem de se ir reciclando, para se adaptar ao mundo que fabricou.
estamos entrando na era da individualidade, o que não tem nada a ver com egoísmo. o egoísta não tem energia própria; ele se alimenta da energia que vem do outro, seja ela financeira ou moral.
a nova forma de amor, ou mais amor, tem nova feição e significado. visa a aproximação de dois inteiros e não a união de duas metades. e ela só é possível para aqueles que conseguem trabalhar a sua individualidade. quanto mais o indivíduo for competente para viver sozinho, mais preparado estará para uma boa relação afectiva.
a solidão é boa, ficar sozinho não é vergonhoso. ao contrário, dá dignidade à pessoa. as boas relações afectivas são óptimas, são muito parecidas com o ficar sozinho, ninguém exige nada de ninguém e ambos crescem. relações de dominação e de concessões exageradas são coisas do século passado.
cada cérebro é único. nosso modo de pensar e agir não serve de referência para avaliar ninguém. muitas vezes pensamos que o outro é nossa alma gémea e, na verdade, o que fizemos foi inventá-lo ao nosso gosto.
todas as pessoas deveriam ficar sozinhas de vez em quando, para estabelecer um dialogo interno e descobrir sua força pessoal.
na solidão, o indivíduo entende que a harmonia e a paz de espírito só podem ser encontradas dentro dele mesmo, e não a partir do outro. ao perceber isso, ele se torna menos crítico e mais compreensivo quanto às diferenças, respeitando a maneira de ser de cada um.
o amor de duas pessoas inteiras é bem mais saudável. nesse tipo de ligação, há o aconchego o prazer da companhia e o respeito pelo ser amado. nem sempre é suficiente ser perdoado por alguém, algumas vezes você tem que aprender a se perdoar a si mesmo.
sawabona é um cumprimento usado no sul da áfrica. significa “eu te respeito, eu te valorizo, você é importante para mim”. em resposta as pessoas dizem shikoba que é: “então eu existo para você”.

flávio gikovate

[5.dezembro.2008]


não tinha sentido pensar em ti e não sair a correr para a rua
procurar-te imediatamente
correr a cidade duma ponta a outra
só para te dizer boa noite ou talvez tocar-te
e morrer

al berto

(e morrer)



[3.dezembro.2008]

j'ai une idée inattaquable
pour éviter l'insupportable

avant la haine, avant les coups
de sifflet ou de fouet
avant la peine et le dégout

(do filme dans paris)